Abandono de negociações explica embaixadas em Jerusalém
Trata-se de uma promessa de campanha e de um tema muito explorado nas redes bolsonaristas — com um toque de provocação marota aos adversários políticos —, mas eis que o presidente Jair Bolsonaro colocou os pés em Israel e as mãos no Muro das Lamentações sem fazer o tão esperado e criticado anúncio de que a embaixada brasileira será transferida para Jerusalém. Em vez disso, informou que abrirá um escritório de negócios na cidade, o que está sendo o bastante para provocar reclamações por parte das nações árabes mas não configura um reconhecimento de Jerusalém como capital de Israel.
Vamos esclarecer que, para todos os efeitos administrativos e políticos, é em Jerusalém que estão sediados o governo e o parlamento israelense — então, sim, na prática essa é a capital do país. A questão é que a cidade é reclamada também como capital dos palestinos e, como a parte oriental e árabe está sob ocupação israelense, a recomendação da ONU, seguida pela imensa maioria dos países, é de manter as embaixadas em Tel Aviv. Trata-se de uma forma de condicionar o reconhecimento de Jerusalém como capital de Israel a uma solução negociada para a questão árabe-israelense.
O problema é que as negociações estão abandonadas há anos. A última tentativa, que resultou em fracasso, ocorreu em abril de 2014, por iniciativa do governo americano de Barack Obama. Durante aquele processo, ficou claro que o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, no cargo há 10 anos, estava mais interessado em fazer jogo de cena para enrolar os americanos, de cuja boa vontade ele dependia para outras questões geopolíticas, como o conflito com o Irã, do que propriamente para fazer qualquer tipo de concessão aos palestinos. Do lado árabe, a coisa não era muito melhor: afinal, a Autoridade Palestina de Mahmoud Abbas tem um problema sério de autoridade, a começar pelo fato de que não possui influência nenhuma sobre o que acontece na Faixa de Gaza, o território palestino que é controlado pelo grupo terrorista Hamas.
Antes disso, a única oportunidade real de estabelecer um Estado palestino coexistindo com o Estado israelense surgiu no ano 2000 nas negociações de Camp David, nos Estados Unidos, com mediação do então presidente americano Bill Clinton. A proposta não representava o melhor dos mundos para os palestinos, mas foi o melhor que se ofereceu a eles e nada de melhor foi oferecido desde então. Ainda assim, o presidente palestino Yasser Arafat recusou a oferta e abandonou as conversas.
Apesar de outras tentativas de conversas nesse meio tempo, é justo dizer que a ideia de uma solução negociada para a questão dos dois Estados não passa disso, uma ideia — e uma na qual quase ninguém mais acredita, nem entre os israelenses, nem entre os palestinos.
Como a vida segue, ambos os lados partiram para decisões unilaterais. Em 2011, por exemplo, Abbas entregou à ONU um pedido de reconhecimento da Palestina como Estado membro da organização. Um ano antes, o Brasil, sob o governo de Lula, já havia feito esse reconhecimento — uma decisão quase tão inócua e motivada mais por ideologia do que por objetivos práticos quanto a promessa de Bolsonaro de mudar a embaixada para Jerusalém. Em 2012, a Assembleia Geral da ONU elevou o status da Palestina de "entidade observadora" para "Estado observador não-membro", equivalente ao que desfruta o Vaticano.
O problema de decisões unilaterais é que elas desperdiçam cartas que poderiam ser guardadas na manga para usar durante eventuais negociações. É precisamente por isso que a decisão de Donald Trump de mudar a embaixada americana de Tel Aviv para Jerusalém, em 2018, foi uma oportunidade perdida. O presidente americano poderia ter oferecido esse reconhecimento em troca de uma disposição de Benjamin Netanyahu de voltar à mesa de negociações ou em troca de um congelamento na construção de assentamentos judeus em territórios palestinos.
Mas aí voltamos à constatação de que há uma descrença generalizada em relação a qualquer sucesso que negociações entre palestinos e israelenses poderiam ter. E então prevalece o uso político de medidas que, em outros tempos, seriam grandes ativos diplomáticos: Bolsonaro faz promessa de levar embaixada para Jerusalém com o objetivo de agradar sua base de apoio evangélica, enquanto Netanyahu usa a visita de mais um líder estrangeiro que não esconde seu desprezo pelos palestinos para tentar mostrar força e salvar-se no cargo, já que ele enfrenta acusações de corrupção e uma difícil eleição daqui a apenas oito dias.
Negociações? Quem falou em negociações?
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