O que Netanyahu acha das ideias de Bolsonaro sobre o nazismo?
Nada como uma mentira repetida mil vezes… para ser desmentida mil vezes. O presidente Jair Bolsonaro endossou a tese defendida por seu ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, de que o nazismo era uma ideologia de esquerda. Araújo havia feito essa afirmação no dia 17 de março em entrevista a um canal no YouTube e repetiu-a em um artigo publicado em sua página na internet no sábado passado, um dia antes do início da visita de Bolsonaro a Israel, país cuja fundação está profundamente ligada à memória do extermínio de judeus pelos nazistas.
Depois de visitar o museu do Holocausto em Israel, em que a história que se conta é que o nazismo era uma ideologia de extrema direita, Bolsonaro saiu-se com esta: "Sem dúvidas. É o Partido Nacional Socialista da Alemanha." Há uma unanimidade entre os historiadores sérios de que essa teoria é uma falácia, que já foi bem desmontada nesta reportagem do UOL. Não é o nome que define os traços ideológicos de um movimento político.
Bolsonaro foi a Israel com o objetivo de estreitar os seus laços com Israel, por ora comandado por Benjamin Netanyahu.
Será que Bibi, como o premiê israelense é chamado, ficou ofendido com a declaração? Vai haver um pedido de retratação? Acho difícil. Afinal, ele mesmo já andou defendendo versões alternativas da história que contradizem o que os pesquisadores do museu do Holocausto de seu país afirmam. Em 2015, por exemplo, ele disse que os nazistas não queriam exterminar os judeus, apenas expulsá-los. Quem teria convencido os alemães a começar uma matança, ainda segundo Bibi, foi o então líder religioso dos palestinos, o Grão Mufti de Jerusalém. Trata-se de uma grande bobagem, rechaçada pelos principais historiadores do holocausto.
Na verdade, a tese de que o nazismo era um movimento de esquerda até cai bem politicamente para Bibi, ele próprio um político de direita. Vale a ressalva de que ser de direita, em Israel, é diferente de ser de direita no Brasil ou em outros lugares. Lá, a distância entre os extremos políticos é medida principalmente pela postura frente às reivindicações palestinas.
Nos últimos tempos, Bibi tem sido criticado por se aproximar de líderes do Leste Europeu que representam uma direita conservadora, nacionalista, xenófoba e antiliberal. Ocorre que esses governantes, como o primeiro-ministro da Hungria Viktor Orbán e Jarosław Kaczyński, líder de um dos principais partidos da Polônia e ex-presidente do país, flertam também com o antissemitismo. Netanyahu aproximou-se dessas figuras não apenas por questões diplomáticas, pragmáticas, mas por pura afinidade de pensamento, no que se refere ao conservadorismo, ao nacionalismo, à xenofobia e ao antiliberalismo. Por motivos óbvios, ele prefere empurrar a parte do antissemitismo para debaixo do tapete.
Essa aliança de Bibi com os nacionalistas do Leste Europeu foi posta à prova no início do ano passado, quando a Polônia aprovou uma lei que proibia menções à conivência de poloneses com o holocausto. Em fevereiro deste ano, Netanyahu se viu obrigado a declarar que "poloneses cooperaram com os nazistas". Apesar da rusga diplomática que isso causou, o fato é que a atual conjuntura política na Polônia é vista como positiva pela direita israelense, como observou o historiador polonês-israelense Zeev Sternhell em artigo recente na revista Foreign Policy.
Por fim, vale a pena mencionar uma polêmica envolvendo o filho de Benjamin Netanyahu, Yair, que em 2017 publicou em sua conta no Facebook que considera o ativismo de esquerda pior e mais perigoso do que o neonazismo. De fato, há antissemitismo em ambos. Talvez a declaração se deva ao fato de que ninguém duvida que o neonazismo é de direita. Ou duvida?
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