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Diogo Schelp

O excêntrico Boris Johnson, possível substituto de Theresa May

Diogo Schelp

27/05/2019 17h19

Boris Johnson

Boris Johnson (Hannah McKay/Reuters)

Há mais de uma maneira de interpretar o resultado da votação britânica para o Parlamento Europeu, encerrada no domingo, 26. Uma delas consiste em considerar a acachapante vitória do Partido do Brexit, que obteve o maior número de assentos entre as legendas do Reino Unido, uma confirmação inequívoca do desejo dos britânicos de que o seu país deixe a União Europeia (UE). Outra possibilidade é comparar a soma de votos que partidos pró-saída (a favor do Brexit) e pró-permanência na UE receberam. Por esse critério, a vontade de não sair da UE prevalece. Afinal, os dois partidos pró-saída (Partido do Brexit e Ukip) receberam 34,9% dos votos. Já os cinco partidos pró-permanência (dos quais os principais são os Liberais Democratas e os Verdes) tiveram 40,4% dos votos. Em cima do muro ficam os partidos Conservador e Trabalhista, que reúnem tanto políticos contra quanto a favor do Brexit, com 23,2% dos votos.

A derrota dos conservadores e dos trabalhistas, que pertencem às legendas mais tradicionais do sistema político britânico, vai forçá-los a tomar uma posição mais consistente a respeito do Brexit. Além disso, impulsiona a realização de um novo referendo sobre o Brexit (o primeiro, em 2016, deu vitória apertada para o movimento a favor da saída da UE). Os britânicos descobriram, ao longo dos últimos três anos, que o divórcio com o bloco europeu não poderá ser feito sem traumas. Depois dos resultados de domingo, Jeremy Corbyn, líder do Partido Trabalhista, mostrou-se inclinado a apoiar a realização de um novo referendo.

No Partido Conservador, a tendência é seguir o caminho contrário. A premiê conservadora Theresa May vai renunciar no próximo dia 7 de junho depois de fracassar na tentativa de aprovar no parlamento britânico o acordo de divórcio que ela costurou com a União Europeia. O governo de May tinha como foco negociar os termos da saída do Reino Unido da UE. Agora, o Partido Conservador terá de escolher um substituto que leve a cabo essa missão.

O candidato mais forte é Boris Johnson, ex-prefeito de Londres e ex-ministro de Relações Exteriores. Johnson é um efusivo defensor do Brexit. Ele fez campanha pela saída do Reino Unido do bloco e, no ano passado, pediu demissão da pasta de Relações Exteriores por discordar dos planos de May para as negociações com Bruxelas.

Johnson é um agitador. Em sua coluna semanal de um grande jornal, escreveu no ano passado: "Nós colocamos um colete-bomba ao redor da constituição britânica e entregamos o detonador" ao chefe da negociação com a União Europeia. Seis anos atrás, em uma entrevista em um programa da TV americana, Johnson disse que poderia disputar a presidência dos Estados Unidos. O motivo: nascido em Nova York, ele tinha dupla cidadania. Atualmente, terá de se contentar em ser primeiro-ministro britânico, pois renunciou ao passaporte americano por causa de problemas com o fisco do outro lado do Atlântico.

Se vencer a disputa interna do Partido Conservador, Johnson entrará em uma nova competição: a de governante anglófono com a cabeleira mais chamativa. Seu penteado loiro já foi comparado por um colunista britânico ao de um poodle descabelado. Nos últimos meses, o corte está menos rebelde por influência de uma nova namorada. Nesse quesito, portanto, é provável que o presidente americano Donald Trump vença — ainda que, certa vez, durante uma viagem a Nova York, Johnson tenha sido confundido com o bilionário americano, de quem é amigo.

A carreira pública de Johnson começou na imprensa britânica. Ele foi demitido do The Times depois de incluir citações falsas em uma reportagem, atribuindo-as a um professor da Universidade de Oxford que, não por acidente, também era seu padrinho.

Johnson é conhecido por ter um ego do tamanho do Big Ben. Em seu livro sobre Winston Churchill, o primeiro-ministro que comandou o Reino Unido da vitória contra os nazistas, o personagem mais citado além do principal é ele próprio, Boris Johnson.

O ex-prefeito terá que disputar a liderança de seu partido com pelo menos outros oito candidatos, em um processo que pode levar algumas semanas. Os parlamentares do Partido Conservador fazem uma votação em que, a cada rodada, o candidato menos votado é eliminado. Os dois nomes restantes são submetidos, então, a uma eleição na qual votam todos os membros do partido, algo em torno de 120.000 pessoas. O vencedor será o próximo premiê. Johnson tem a preferência de 39% dos filiados, muito à frente do segundo colocado, com 13%.

Sobre o Autor

Diogo Schelp é jornalista com 20 anos de experiência. Foi editor executivo da revista VEJA e redator-chefe da ISTOÉ. Durante 14 anos, dedicou-se principalmente à cobertura e à análise de temas internacionais e de diplomacia. Fez reportagens em quase duas dezenas de países. Entre os assuntos investigados nessas viagens destacam-se o endurecimento do regime de Vladimir Putin, na Rússia, o narcotráfico no México, a violência e a crise econômica na Venezuela, o genocídio em Darfur, no Sudão, o radicalismo islâmico na Tunísia e o conflito árabe-israelense. É coautor dos livros “Correspondente de Guerra” (Editora Contexto, com André Liohn) e “No Teto do Mundo” (Editora Leya, com Rodrigo Raineri).

Sobre o Blog

“O que mantém a humanidade viva?”, perguntava-se o dramaturgo alemão Bertolt Brecht. Essa é a pergunta que motiva esse blog a desembaraçar o noticiário internacional – e o nacional, também, quando for pertinente – e a lançar luz sobre fatos e conexões que não receberam a atenção devida. Esse é um blog que quer surpreender, escrito por alguém que gosta de ser surpreendido.