Armar a população reduz a criminalidade?
O presidente Jair Bolsonaro insiste em seus planos de flexibilizar o porte e a posse de armas para a população civil. Já escrevi antes que a medida é uma cortina de fumaça que envolve a questão da segurança pública no Brasil. Isso não quer dizer que não se deva reconhecer o direito da população de ter armas de fogo. Apenas que elas não são a solução para a alta criminalidade que vigora no país.
Aqueles que defendem a flexibilização do porte e da posse de armas como forma de combater a criminalidade estão errados. Quem afirma o contrário, que colocar mais armas nas mãos de civis levará invariavelmente a um aumento nos índices de violência, também está equivocado. Os números internacionais mostram que não há uma relação direta entre os dados de posse de armas e as estatísticas de mortes violentas.
Observe inicialmente a seguinte lista de países, ricos e pobres, com alta e baixa proporção de armas na população:
Índice de armas de fogo por 100 habitantes
Estados Unidos
120,5
Canadá
34,7
Áustria
30
Paquistão
22,3
França
19,6
Alemanha
19,6
Venezuela
18,5
Austrália
14,5
Honduras
14,1
Croácia
13,7
México
12,9
Bélgica
12,7
Chile
12,1
Guatemala
12,1
El Salvador
12
Colômbia
10,1
Costa Rica
10
Dinamarca
9,9
Brasil
8,3
Argentina
7,4
Israel
6,7
Índia
5,3
Reino Unido
4,6
China
3,6
Bolívia
2
Equador
2,4
Japão
0,3
Fonte: Small Arms Survey
Agora, veja como esses mesmos países se enquadram nos grupos de altos, médios, baixos e muito baixos índices de homicídios:
Países com 20 ou mais mortes violentas por 100.000 habitantes (alto)
Brasil, Honduras, El Salvador, Colômbia, Guatemala, Venezuela
Entre 10 e 19,9 mortes violentas por 100.000 habitantes (médio)
Bolívia, México, Paquistão
Entre 3 e 9,9 mortes violentas por 100.000 habitantes (baixo)
Estados Unidos, Argentina, Equador, Costa Rica, Índia
Menos de 3 mortes violentas por 100.000 habitantes (muito baixo)
Canadá, Reino Unido, França, Alemanha, Bélgica, Áustria, Dinamarca, Israel, Japão, China, Croácia
No grupo dos países com índices muito baixos de mortes violentas, estão tanto aqueles com alta concentração de armas nas mãos de civis, como Canadá e Áustria, quanto os que têm pouquíssimas armas entre os cidadãos, como o Reino Unido, o Japão e a China.
Já nos grupos de países com alto ou médio índice de mortes violentas, há tanto nações com baixa (Bolívia) quanto com média ou alta concentração de armas (Honduras, Venezuela e Paquistão).
Se uma população civil bem armada fosse determinante para reduzir a criminalidade, os Estados Unidos não deveriam estar no grupo de países com índices de mortes violentas equivalentes aos da Índia e do Equador, cujas populações quase não têm acesso a armas de uso pessoal. E a Dinamarca e a Argentina, países onde as proporções de armas nas mãos de civis são parecidas com as dos Brasil, correriam o risco de ter níveis brasileiros de mortes violentas.
As taxas de crimes violentos de uma sociedade são definidas por um conjunto de fatores sociais, econômicos, culturais e institucionais. Não adianta buscar soluções mágicas. O que funciona na segurança pública é criar emprego para a população, investir em corporações policiais melhores, aumentar a eficiência da Justiça e acabar com a impunidade.
O resto é cortina de fumaça.
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