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Diogo Schelp

Vazamento de mensagens diplomáticas britânicas é um presentão para Trump

Diogo Schelp

09/07/2019 13h25

Donald Trump

Presidente dos EUA, Donald Trump, em Washington, no dia 8 de julho (Foto: Carlos Barria/Reuters)

Para entender a mais nova batalha verbal do presidente americano Donald Trump no Twitter é preciso comparar as primeiras páginas dos principais sites de notícias da Inglaterra e dos Estados Unidos nesta terça-feira (9). Na homepage do New York Times e do Washington Post, os assuntos com maior destaque eram questões políticas domésticas e o escândalo envolvendo o magnata do setor financeiro Jeffrey Epstein, preso por tráfico sexual de meninas adolescentes. Nas páginas dos jornais britânicos, por sua vez, a atenção era dada à polêmica envolvendo o vazamento de mensagens diplomáticas contendo críticas de Kim Darroch, embaixador do Reino Unido em Washington, a Trump.

A imprensa britânica está especialmente alvoroçada com os ataques que Trump vem desferindo contra Darroch e contra a premiê britânica Theresa May no Twitter. O presidente americano tuitou que Darroch é "louco", "estúpido" e "imbecil". Isso um dia depois de dizer que não ia se dar ao trabalho de responder às críticas de Darroch, que nas mensagens confidenciais classificou o governo do americano como "inepto" e "disfuncional". Já os ataques a May foram motivados pelo fato de a premiê, que está de saída do cargo, ter dito que mantém seu apoio ao embaixador, mesmo após a publicação dos seus telegramas na imprensa britânica. Trump chamou a tentativa de May de obter um acordo negociado para a saída do Reino Unido da União Europeia "um desastre" e disse que ela agiu de maneira "tola" ao não ouvir os seus conselhos de como fazer a negociação.

Trump, na realidade, não tem motivos para se preocupar com as mensagens vazadas na Inglaterra. Elas não o comprometem em nada. Expressam apenas a opinião e a análise de um embaixador estrangeiro em mensagens sigilosas para os seus superiores. O constrangimento atinge apenas Darroch, o autor das mensagens.

Mas Trump costuma recorrer à tática de iniciar embates no Twitter toda vez que sente necessidade de criar um fato novo que desvie a atenção da imprensa de outros assuntos. E, atualmente, o assunto que Trump gostaria de ver enterrado é a história do pedófilo Epstein.

Duas das reportagens em destaque nas páginas do Washington Post e do New York Times chamam atenção para os vínculos entre Epstein e Trump. "Trump chamava Epstein de 'grande sujeito' que gostava de mulheres 'mais jovens'. Agora nega a amizade com ele", escancara o título de uma reportagem na primeira página do site do Washington Post. Um artigo da colunista Michelle Goldberg, do New York Times, por sua vez, reforça:

Epstein costumava andar com Donald Trump, que em 2002 o descreveu para a revista New York como um "grande sujeito" que ele conhecia há 15 anos. "Costuma-se dizer que ele gosta tanto de mulheres bonitas quanto eu, e muitas delas são jovens", disse o futuro presidente. Em 2000, um porteiro que trabalhava no imóvel vizinho à mansão de Epstein em Manhattan disse a um jornal britânico, admirado: "Eu frequentemente vejo Donald Trump e uma penca de modelos entrando e saindo, normalmente à noite. É impressionante".

Impressionante, mesmo. Já a imprensa americana não está se deixando impressionar com as tentativas de Trump de criar um novo factoide online, desviando a atenção para seus ataques a Theresa May e o embaixador britânico. Isso é assunto menor. O que todos querem saber é se Trump tinha alguma relação com a rede de pedofilia que Epstein, que era amigo também do ex-presidente Bill Clinton, montou bem na frente do nariz da elite nova-iorquina.

Sobre o Autor

Diogo Schelp é jornalista com 20 anos de experiência. Foi editor executivo da revista VEJA e redator-chefe da ISTOÉ. Durante 14 anos, dedicou-se principalmente à cobertura e à análise de temas internacionais e de diplomacia. Fez reportagens em quase duas dezenas de países. Entre os assuntos investigados nessas viagens destacam-se o endurecimento do regime de Vladimir Putin, na Rússia, o narcotráfico no México, a violência e a crise econômica na Venezuela, o genocídio em Darfur, no Sudão, o radicalismo islâmico na Tunísia e o conflito árabe-israelense. É coautor dos livros “Correspondente de Guerra” (Editora Contexto, com André Liohn) e “No Teto do Mundo” (Editora Leya, com Rodrigo Raineri).

Sobre o Blog

“O que mantém a humanidade viva?”, perguntava-se o dramaturgo alemão Bertolt Brecht. Essa é a pergunta que motiva esse blog a desembaraçar o noticiário internacional – e o nacional, também, quando for pertinente – e a lançar luz sobre fatos e conexões que não receberam a atenção devida. Esse é um blog que quer surpreender, escrito por alguém que gosta de ser surpreendido.