Macron afundou a ajuda para a Amazônia que ele mesmo construiu
Sejamos justos com a decisão do governo brasileiro de recusar os recursos oferecidos pelo G7, o grupo dos países mais ricos do mundo, para combater as queimadas na Amazônia: o presidente Emmanuel Macron, da França, não deu muitas opções.
No jogo diplomático, os atores tentam adivinhar as intenções por trás das ações uns dos outros. Desde o princípio, ficou claro que Macron queria extrair dividendos políticos ao incluir o tema amazônico na pauta da reunião do G7, na França. Outros temas eram o foco da cúpula, a começar pela questão do programa nuclear iraniano.
Detalhe: além de o assunto ter entrado na pauta de última hora, ou precisamente por causa disso, nenhum representante brasileiro estava presente para dar a sua palavra para o que estava sendo discutido. Por outro lado, Macron reuniu-se às margens do G7 até com o ministro das Relações Exteriores iraniano, Mohammad Javad Zarif, que está sob sanções americanas.
Ciente de que não era possível tomar decisões sem consultar o maior interessado — o representante do povo brasileiro —, a chanceler alemã Angela Merkel tratou de baixar a bola de Macron, dizendo, em conversa gravada por acaso, que era preciso ligar para o presidente Jair Bolsonaro.
O máximo que Macron conseguiu, portanto, foi o anúncio da ajuda de 20 milhões de dólares, a maior parte na forma de envio de aviões canadenses para ajudar no combate às queimadas.
Eis que, na tentativa de capitalizar politicamente com a ajuda acertada pelo G7, Macron saiu-se com duas declarações que tornaram mais complicada a aceitação do dinheiro por parte do governo brasileiro.
A primeira foi a que questionou o "status" da Amazônia. Como um governo repleto de militares, como o brasileiro, interpretaria uma afirmação dessas? Se essa era a tônica da ajuda, que cobranças viriam depois? Era evidente que uma declaração que coloca em dúvida a soberania brasileira sobre o território amazônico mexeria com o patriotismo dos integrantes do governo.
A segunda afirmação problemática foi a de que os brasileiros merecem um presidente "à sua altura".
Macron pode não gostar de Bolsonaro, e tem bons motivos para isso (a declaração foi dada em resposta a um comentário machista de Bolsonaro sobre a mulher de Macron, no Twitter). Mas, gostando ou não, Bolsonaro foi eleito democraticamente. Quem tem que decidir quem está à altura do povo brasileiro é o próprio povo brasileiro.
Expressar o desejo de que um país troque de presidente "logo": isso é algo que um chefe de Estado só deveria dizer quando está se referindo a um ditador. E no Brasil (ainda) vigora uma democracia.
As declarações de Macron apenas reforçam a convicção de que a preocupação dele com a Amazônia é marginal. Ele está mais é preocupado em usar o tema para obter ganhos políticos internos.
O problema é que Bolsonaro leva tudo para o lado pessoal.
Em artigo recente para ao jornal The New York Times, Charles M. Blow escreveu que "para Donald Trump, tudo é pessoal. (…) tudo se baseia na imagem e está enraizado na aparência das relações pessoais". É possível usar as mesmas palavras para descrever Bolsonaro.
Ele disse que, se Macron pedir desculpas por chamá-lo de mentiroso, poderia reconsiderar a proposta do G7. A condição soa patética. Afinal, Bolsonaro também passou dos limites, e muito, nas trocas de farpas com Macron.
Enquanto a questão era colocada em termos de soberania e interesses de atores internacionais, fazia algum sentido.
Quando o cerne do problema é deslocado para comportamentos de quinta série, só tem uma saída: Octógono do UFC.
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