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Diogo Schelp

Saiba quais países dão cidadania por nascimento, execrada por Trump

Diogo Schelp

28/08/2019 14h40

Cidadania por nascimento

Nada menos que 26 dos 30 países que adotam o jus soli ficam no Continente Americano (Imagem: Diogo Schelp/MapChart)

O presidente americano Donald Trump disse, pela segunda vez em menos de um ano, que pensa em derrubar o direito de que qualquer pessoa nascida nos Estados Unidos tenha cidadania americana. Stephen Miller, um de seus principais assessores, confirmou no domingo (25) que a Casa Branca está estudando as "opções legais" para fazer a mudança. 

A medida seria uma forma de conter a imigração ilegal no país. Para isso, seria preciso alterar a 14ª emenda da Constituição americana. Trump sugeriu fazer a mudança via ordem executiva, criando condições para o direito de cidadania — como a de que os pais devem ao menos serem residentes legais no país.

Em outubro do ano passado, Trump já tinha apresentado essa ideia, argumentando que os Estados Unidos são o "único país no mundo onde a pessoa chega e tem um bebê, e o bebê se torna cidadão". A afirmação não poderia ser mais falsa.

Os Estados Unidos são o país mais populoso que adota o jus soli ("direito de solo", como é chamada essa regra de concessão de cidadania). Em segundo lugar vem o Brasil. Outros 28 países, a grande maioria no Continente Americano, também garantem esse direito de maneira incondicional (salvo, em alguns casos, para filhos de diplomatas ou de integrantes de forças invasoras).

São eles: Antígua e Barbuda, Argentina, Barbados, Belize, Canadá, Chade, Chile, Cuba, Dominica, Equador, El Salvador, Fiji, Granada, Guatemala, Guiana, Honduras, Jamaica, Lesoto, México, Paquistão, Panamá, Paraguai, Peru, São Cristóvão e Neves, Santa Lúcia, São Vicente e Granadinas, Uruguai e Venezuela.

Nas nações restantes (quase todas as que estão ao leste da antiga linha de Tordesilhas, como mostra o mapa acima), vigora o jus sanguini ("direito de sangue", em que é preciso ser filho de pelo menos um cidadão local para obter a nacionalidade) ou variações mais restritivas do jus soli. Na Malásia, por exemplo, um bebê pode ser registrado como cidadão desde que os pais tenham visto de residência permanente.

TENDÊNCIA MUNDIAL

Os planos restritivos de Trump, ao contrário de outras de suas políticas, por incrível que pareça, não estão na contramão da história. Outros países já andaram restringindo suas regras de concessão de cidadania.

A França, por exemplo, aboliu a cidadania por nascimento incondicional em 1993. Atualmente, um filho de imigrantes pode requisitar a nacionalidade apenas ao fazer 18 anos. No Reino Unido, a partir de 1983, passou-se a reconhecer a cidadania apenas de pessoas nascidas de um pai ou de uma mãe com residência permanente. A Irlanda foi o último país da Europa a extinguir o jus soli, em 2005, por meio de um referendo.

O caso mais ultrajante, porém, é o da República Dominicana, que em 2013 não apenas aboliu a cidadania por nascimento, como o fez de maneira retroativa para filhos de imigrantes ilegais, transformando milhares de crianças em apátridas da noite para o dia.

No caminho inverso está a Alemanha, que em 2000 abriu uma brecha na sua tradição jus sanguini. Atualmente, um jovem filho de imigrantes pode requisitar a cidadania alemã, desde que ao menos um dos pais resida há oito anos no país, dos quais ao menos três legalmente.

O jus soli é o princípio dominante na América Latina e no Caribe justamente pelo interesse histórico da região em atrair imigrantes. Nos Estados Unidos, a regra está atrelada à abolição da escravidão: era preciso garantir que os escravos libertos e seus filhos fossem reconhecidos como americanos.

 

Sobre o Autor

Diogo Schelp é jornalista com 20 anos de experiência. Foi editor executivo da revista VEJA e redator-chefe da ISTOÉ. Durante 14 anos, dedicou-se principalmente à cobertura e à análise de temas internacionais e de diplomacia. Fez reportagens em quase duas dezenas de países. Entre os assuntos investigados nessas viagens destacam-se o endurecimento do regime de Vladimir Putin, na Rússia, o narcotráfico no México, a violência e a crise econômica na Venezuela, o genocídio em Darfur, no Sudão, o radicalismo islâmico na Tunísia e o conflito árabe-israelense. É coautor dos livros “Correspondente de Guerra” (Editora Contexto, com André Liohn) e “No Teto do Mundo” (Editora Leya, com Rodrigo Raineri).

Sobre o Blog

“O que mantém a humanidade viva?”, perguntava-se o dramaturgo alemão Bertolt Brecht. Essa é a pergunta que motiva esse blog a desembaraçar o noticiário internacional – e o nacional, também, quando for pertinente – e a lançar luz sobre fatos e conexões que não receberam a atenção devida. Esse é um blog que quer surpreender, escrito por alguém que gosta de ser surpreendido.