Taxar os ricos, como quer candidata americana, pode reduzir desigualdade?
O assunto está fervendo nos Estados Unidos. Nesta quinta-feira (7), a pré-candidata democrata à presidência Elizabeth Warren avisou, no Twitter, que aceita o desafio do bilionário Bill Gates de discutir cara a cara a proposta dela de taxar as grandes fortunas para usar o dinheiro em educação e saúde pública.
No Brasil, mal se fala no assunto. Mas está lá no artigo 153, inciso VII, da Constituição Federal brasileira: "Compete à União instituir impostos sobre (…) grandes fortunas, nos termos de lei complementar."
A taxação dos ricaços, porém, jamais foi regulamentada e há baixa probabilidade de que o seja no curto ou médio prazo. Até existe uma emenda ao projeto de reforma tributária na Câmara, assinada por deputados de esquerda, que propõe taxar em 0,5% as fortunas que passarem de 15 milhões de reais, mas a chance de que entre no pacote é baixíssima.
Imposto arrojado
Os planos de Warren são mais arrojados. Ela quer cobrar um imposto de 2% ao ano sobre todo patrimônio pessoal que passar de 50 milhões de dólares e 6% sobre o que superar 1 bilhão de dólares. Bill Gates, cuja fortuna é de mais de 100 bilhões de dólares, pagaria cerca de 6,4 bilhões de dólares por ano.
O fundador da Microsoft disse ao The New York Times que a taxação exagerada sobre grandes fortunas colocam em risco a formação de capital e, como consequência, a inovação nas empresas americanas. Em seguida, questionou se Warren estaria disposta a se sentar diante de um bilionário como ele para debater o assunto.
O próprio jornal americano, porém, rebateu Gates, dizendo que os impostos sobre a renda dos americanos mais ricos caiu de 51,5%, em 1961, para 33,2%, em 2011. Ou seja, ao menos pelo critério da renda, os ricos do país estão pagando menos impostos do que há algumas décadas.
A discussão entre economistas de diferentes linhagens, porém, é se a taxação de grandes fortunas realmente teria um impacto negativo na economia, como sugeriu Gates, e se, por outro lado, seria capaz de atingir os objetivos propostos por Warren e outros candidatos democratas, como Bernie Sanders.
Contra a desigualdade
Os três principais objetivos de Warren são: 1) aumentar a arrecadação para melhorar os serviços públicos para a população; 2) reduzir a crescente desigualdade entre ricos e pobres; e 3) diminuir o poder político desproporcional dos bilionários.
O próprio exemplo de Gates, no entanto, já respondem aos itens 2 e 3. Isso porque os rendimentos que ele obteve no ano passado com investimentos superam a mordida que o leão daria em seu patrimônio anualmente.
Ou seja, mesmo com o imposto sugerido por Warren, Bill Gates continuaria enriquecendo a cada ano. O mesmo ocorreria com outros bilionários. A distância entre os ricaços e a base da pirâmide social seguiria aumentando e o poder político dos magnatas permaneceria imaculado.
O capital faz as malas
Os economistas Emmanuel Saez e Gabriel Zucman, da Universidade da Califórnia, em Berkeley, estimam que a taxação das grandes fortunas proposta por Warren arrecadaria 210 bilhões de dólares por ano.
Outros economistas são menos otimistas, e dizem que a medida provocaria uma fuga de capital e de bilionários para outros países — o que acabaria por reduzir tanto a arrecadação de impostos quanto os investimentos internos que aquecem a economia e a criação de empregos. (Contra isso, Warren quer impor um imposto de 40% sobre fortunas que "emigram".)
Os juristas especializados em tributação são ainda mais pessimistas e dizem que o aumento da arrecadação seria de 0% (sim, zero porcento), pelo simples fato de que a taxação seria inconstitucional.
Pela constituição americana, a cobrança de impostos diretos deve ser proporcional ao tamanho da população de cada estado. Se a Califórnia, por exemplo, tem 12% da população americana, deveria pagar 12% dos impostos diretos sobre grandes fortunas, não importando se a proporção de bilionários que lá vivem é muito maior do que no resto do país.
Em resumo, a proposta de Warren provavelmente seria derrubada na Suprema Corte americana.
Nem desastre, nem solução
Antes de morrer na praia, a discussão em torno do imposto sobre grandes fortunas nos Estados Unidos está tendo o efeito de colocar em questão a moralidade da concentração de riquezas inimagináveis no bolso de um minoria ínfima da população.
Do ponto de vista prático, porém, não seria nem o desastre para a economia que reclamam alguns, nem a panaceia para a desigualdade que anunciam outros.
Mas tem se provado muito útil para a estratégia eleitoral de Elizabeth Warren.
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