Quem é o magnata chavista que incentivou a rebelião militar contra Maduro
Qual é o melhor caminho para solucionar a crise na Venezuela e encerrar a ditadura chavista? Negociações diretas com o regime de Nicolás Maduro, como as que estão sendo realizadas na Noruega por representantes de Juan Guaidó, presidente de direito da Venezuela? Ou a estratégia americana de pressionar a elite chavista com sanções financeiras? As duas soluções podem ser complementares ou se anulam? A oposição venezuelana não consegue chegar a uma resposta unânime para essas perguntas.
As negociações com Maduro se provaram infrutíferas inúmeras vezes no passado. Serviram apenas para que o ditador ganhasse tempo nos momentos em que seu poder se mostrava mais enfraquecido. Por outro lado, Guaidó parece ter encontrado um limite para sua capacidade de mobilização contra o regime chavista. A "Operação Liberdade", como ele alcunhou a tentativa de promover um levante para derrubar Maduro, em 30 de abril, fracassou, pois as principais lideranças militares não aderiram.
Quanto à efetividade das sanções americanas, vale analisar o caso de um proeminente empresário chavista que foi incluído em janeiro deste ano na lista de venezuelanos que tiveram seus bens nos Estados Unidos congelados e foram impedidos de fazer negócios com cidadãos e empresas americanos.
Raúl Gorrín é o que os venezuelanos chamam de "boliburguês", ou seja, um integrante da burguesia bolivariana, a classe de empresários e funcionários públicos que se aproximou da cúpula do regime chavista, desde os tempos do presidente Hugo Chávez, para obter negócios lucrativos e, na maioria das vezes, ilícitos.
Advogado de origem pobre, ele usou suas conexões no sistema judiciário da Venezuela para ingressar nas altas rodas do regime. Gorrín enriqueceu ao entrar no negócio de seguros e de casas de câmbio, a galinha de ovos de ouro do corrupto sistema financeiro venezuelano. Em 2013, ele comprou a Globovisión, até então o único canal de notícias independente da Venezuela e que durante anos sofreu intensa pressão financeira e judicial do governo de Hugo Chávez, transformando-a em mais um veículo de comunicação subserviente ao regime.
Em agosto do ano passado, Gorrín foi acusado pela Justiça americana de ter lucrado bilhões de dólares com operações de câmbio ilegais e de ter subornado altos funcionários venezuelanos, ajudando-os também a lavar o dinheiro. Uma ordem de prisão foi expedida contra ele.
Os mesmos crimes motivaram a inclusão de Gorrín na lista negra do Tesouro americano. Além dele, foram submetidos a sanções sua mulher, Maria Alexandra Perdomo, seu cunhado e sócio, Gustavo Adolfo Perdomo, a esposa dele, Mayela Antonina Tarascio-Pérez, a ex-chefe do Tesouro venezuelano, Claudia Patricia Díaz, e o marido dela, Adrian José Velásquez. Como se vê, a boliburguesia faz tudo em família, inclusive corrupção e lavagem de dinheiro. Também entrou na lista Alejandro Andrade, que foi guarda-costas de Chávez em 1998 e antecessor de Claudia Patricia Díaz no Tesouro da Venezuela entre 2007 e 2010.
O esquema de corrupção e enriquecimento ilícito da gangue funcionava da seguinte forma: as casas de câmbio de Gorrín compravam dólar pelo câmbio oficial, barato, e vendia no mercado paralelo com ágio exorbitante. Nos últimos anos, na Venezuela, o dólar paralelo chegou a valer 200 vezes mais do que no oficial. Ou seja, Gorrín e sua quadrilha lucravam às custas do sofrimento do povo venezuelano, pois as distorções cambiárias eram e são em grande parte responsáveis pela escassez de produtos básicos no país.
Gorrín "comprava" a autorização para obter dólares por meio de pagamentos de suborno a Alejandro Andrade e a Claudia Patricia Díaz na forma de jatinhos, imóveis, cavalos de raça, jóias e relógios de luxo.
Exilado nos Estados Unidos, Andrade disse à Justiça americana, em 2017, que recebeu 1 bilhão de dólares em propinas de Gorrín. Ele está cooperando com as autoridades americanas.
1 bilhão de dólares em propinas para um único funcionário chavista! O número dá uma boa ideia do nível de corrupção do regime. E também do quanto os altos integrantes do governo de Nicolás Maduro têm a perder se ele for apeado do poder.
Para convencê-los a abandonar Maduro e ajudar na transição política, o governo americano tem prometido retirar as sanções a que estão submetidos. Para provar que a oferta é para valer, no dia 7 de maio os Estados Unidos tiraram o general Manuel Cristopher Figuera, ex-chefe da polícia política de Maduro, da lista de sancionados. O militar venezuelano fora o único de alta patente a apoiar a quartelada fracassada de Guaidó, sete dias antes.
Outros generais e altos funcionários chavistas também receberam a mesma oferta, mas permaneceram leais a Maduro, entre eles o ministro da Defesa Vladimir Padrino López e o presidente da Corte Suprema de Justiça, Maikel Moreno.
Quem fez a intermediação com eles foi ninguém menos que Raúl Gorrín, em uma tentativa de obter o perdão das autoridades americanas. O papel do empresário chavista no levante para derrubar Maduro possivelmente explica porque, um mês e meio antes, sua mulher e a de seu cunhado foram retiradas da lista de sancionados.
Mas Gorrín continua sob sanções. Não basta mudar de lado. É preciso mostrar resultados.
O caso Gorrín demonstra que as sanções de fato colocam a elite chavista sob pressão. Eis porque muitos líderes opositores e analistas são contra as negociações na Noruega. Eles acreditam que a estratégia das sanções ainda pode ser melhor explorada.
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