No episódio Marielle, Bolsonaro imita Hugo Chávez e príncipe saudita
"Aqui não tem ditadura. Aqui não tem ditadura", disse o presidente Jair Bolsonaro nesta quarta-feira (30) em Riade, na Arábia Saudita, antes de ir para o aeroporto para embarcar de volta ao Brasil, encerrando o giro de doze dias pela Ásia e pelo Oriente Médio. Ele não estava se referindo à Arábia Saudita, o que seria um contrassenso, mas ao Brasil, ou melhor, ao próprio governo. Contrassenso, também?
O presidente estava respondendo a um questionamento sobre o fato de ter dado a entender — durante a transmissão destemperada que ele fez ao vivo na internet, na madrugada saudita — que não renovaria a concessão da TV Globo em 2022 por causa da reportagem que o canal fez relacionando o seu nome à investigação do assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes.
A ameaça de tirar o maior canal de TV do país do ar, além de ser a velha tática de culpar o mensageiro pelas más notícias, é uma repetição de algo que o antípoda ideológico de Bolsonaro, o falecido presidente venezuelano Hugo Chávez, fez em 2007.
Chávez vivia às turras com o canal RCTV — que, assim como a Globo, produzia as novelas mais populares de seu país — desde de que foi eleito, em 1998. Diversas vezes fez a promessa de não renovar a concessão do canal se seus programas de notícias não parassem de expor as mazelas de seu governo. Por fim, cumpriu a promessa. O canal deixou de ser transmitido em sinal aberto e subsistiu por mais alguns anos, a duras penas, na TV por assinatura.
Mas a discussão em torno da ameaça à Globo desvia o foco do que realmente importa no momento: a elucidação do fato em si, ou seja, do depoimento à polícia que vincula o nome do presidente aos suspeitos de terem matado Marielle e Anderson.
Nesse ponto, a situação de Bolsonaro se assemelha mais à do seu agora "amigo" e "irmão" (como ele mesmo disse), o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman, que teve seu nome associado ao assassinato do jornalista Jamal Khashoggi, cometido dentro da embaixada saudita na Turquia no ano passado. O que se sabe até agora sobre o crime indica que ele pode ter sido organizado por Saud al-Qatani, um assessor muito próximo do príncipe.
As autoridades sauditas, pressionadas por governos estrangeiros, admitem estarem investigando al-Qatani, que era responsável pela estratégia de redes sociais do governo, mas também participou do interrogatório de bilionários sauditas acusados de corrupção, em 2017.
Em sua passagem pela Arábia Saudita, o presidente brasileiro foi recebido diversas vezes e ficou encantado pelo príncipe, que é quem de fato dá as cartas no país.
Se tivesse permanecido mais uns dias em Riade, Bolsonaro poderia aproveitar para pegar com o príncipe umas dicas de como lidar com a constrangedora situação de ter próprio nome citado em uma investigação de assassinato.
A resposta teria sido algo como: "Aqui é uma ditadura".
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