Governo adota discurso de vítima no meio ambiente
Quando se tinha a impressão de que o governo estava disposto a adotar uma postura propositiva para atacar o problema do aumento dos focos de queimadas e de desmatamento na região amazônica, eis que o discurso de vitimização voltou com toda a força, depois que a pressão internacional se intensificou.
É evidente que há uso político da preservação da Amazônia por parte de Emmanuel Macron, presidente da França, que classificou os dados de aumento no desmatamento como "crise internacional". Macron, vale lembrar, foi o mais relutante líder europeu nas negociações de livre comércio entre União Europeia e Mercosul, cujo êxito foi anunciado em junho.
Como eu contei aqui, a chanceler alemã Angela Merkel precisou passar por cima de Macron para que Jean-Claude Juncker, presidente da Comissão Europeia, acelerasse as negociações com os sul-americanos. O setor agrícola francês, fortemente subsidiado, está nos calcanhares de Macron, que não tem desejo nenhum de viver nova onda de protestos, como os dos coletes amarelos que infernizaram sua vida nos últimos meses.
Mas isso tudo faz parte do jogo diplomático.
O que não faz sentido é adotar a vitimização como desculpa para não cumprir com a obrigação de adotar medidas sérias e imediatas para combater o desmatamento, como fez o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, nesta quinta-feira (22). Segundo ele, os europeus usam a questão ambiental para "estabelecer barreiras ao crescimento e ao comércio de bens e serviços do Brasil".
Ora, em primeiro lugar, a preservação da Amazônia interessa antes de tudo ao Brasil. Segundo, nem toda a gritaria externa tem um fundo comercial demagógico. Muitos países europeus, como a Alemanha, estão fazendo um esforço descomunal para adequar-se aos padrões ambientais que eles exigem dos outros. Terceiro, a pressão não se restringe ao Brasil. A revista britânica The Economist, por exemplo, acaba de publicar uma reportagem denunciando o uso intensivo de carvão como fonte de energia em países asiáticos. Há uma preocupação ambiental genuína nessas críticas. E, quarto, os líderes mundiais sentem-se à vontade para subir o tom com o Brasil na questão ambiental justamente porque o governo brasileiro insiste em adotar uma retórica antiambientalista.
É curioso que o governo federal, comandado por um presidente que costuma desprezar a vitimização em outros temas, agora adote uma retórica vitimista em relação ao meio ambiente — seja ao elaborar a teoria de que as queimadas são provocadas por ongs dispostas a prejudicar a sua imagem, seja ao afirmar que o mundo pressiona pela preservação da floresta porque não quer que o Brasil se desenvolva.
Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente, reconheceu a este blogueiro que o desmatamento está, sim, aumentando e que pretende fazer algo a respeito. Fazer, de fato, algo a respeito é a melhor resposta que o Brasil pode dar ao mundo.
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