Site The Intercept já teve fonte presa nos EUA em 2017
Diogo Schelp
25/07/2019 12h52
Reality Winner, ex-prestadora de serviços da NSA (Foto: AFP)
O site de The Intercept, cuja versão brasileira vem divulgando as mensagens de celular entre o então juiz federal Sergio Moro, atualmente ministro da Justiça, e os procuradores da Lava Jato (supostamente vazadas por um grupo de pessoas presas esta semana pela Polícia Federal), foi criticado em 2017 por não proteger a identidade de uma fonte nos Estados Unidos.
Aos 25 anos, Reality Leigh Winner já havia servido durante quatro anos na Força Aérea americana como tradutora de árabe e farsi e atuava como funcionária civil terceirizada da Agência de Segurança Nacional (NSA, na sigla em inglês) quando decidiu roubar documentos secretos e repassá-los a um site de notícias. Reality foi presa pelo FBI, a polícia federal americana, poucas horas depois da publicação do conteúdo pelo site The Intercept. O documento versava sobre tentativas de espionagem e de interferência do governo da Rússia no processo eleitoral americano de 2016 — tema onipresente na política americana até hoje, pois constrange o presidente americano Donald Trump, cuja equipe de campanha procurou ajuda dos russos.
Reality, que detestava Trump, foi condenada a mais de 5 anos de prisão em agosto de 2018 por ter vazado informações relacionadas à segurança nacional. Durante o julgamento da ex-prestadora de serviços da NSA, o site The Intercept não foi mencionado. Mas ela foi presa no mesmo dia da publicação do documento, que ademais tratava do mesmo assunto e tinha a mesma data daquele que foi a razão de sua condenação.
Entre os erros atribuídos ao The Intercept que podem ter ajudado as autoridades a chegar até Reality está o de ter permitido, durante o processo de verificação das informações, que a NSA vislumbrasse uma cópia do documento contendo marcas que revelavam onde e quando ele havia sido impresso. (Reality imprimiu o documento na sede da NSA e traficou-o para fora escondido em sua meia-calça.)
Depois desse episódio, os responsáveis pelo site fizeram um mea-culpa e disseram que estavam revendo os padrões de segurança para resguardar a identidade de suas fontes. No caso do vazamento das mensagens de Moro e dos procuradores da Lava Jato, o The Intercept Brasil negou-se a fornecer os arquivos ou imagens originais das conversas. Além disso, a organização financiadora do The Intercept prometeu pagar pela assessoria jurídica a Reality Winner.
Na era dos grandes vazamentos digitais, está mais difícil governos ocultarem seus segredos. Mas a caça aos informantes, hackers e outras espécies de fontes anônimas também tornou-se mais implacável.
Sobre o Autor
Diogo Schelp é jornalista com 20 anos de experiência. Foi editor executivo da revista VEJA e redator-chefe da ISTOÉ. Durante 14 anos, dedicou-se principalmente à cobertura e à análise de temas internacionais e de diplomacia. Fez reportagens em quase duas dezenas de países. Entre os assuntos investigados nessas viagens destacam-se o endurecimento do regime de Vladimir Putin, na Rússia, o narcotráfico no México, a violência e a crise econômica na Venezuela, o genocídio em Darfur, no Sudão, o radicalismo islâmico na Tunísia e o conflito árabe-israelense. É coautor dos livros “Correspondente de Guerra” (Editora Contexto, com André Liohn) e “No Teto do Mundo” (Editora Leya, com Rodrigo Raineri).
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“O que mantém a humanidade viva?”, perguntava-se o dramaturgo alemão Bertolt Brecht. Essa é a pergunta que motiva esse blog a desembaraçar o noticiário internacional – e o nacional, também, quando for pertinente – e a lançar luz sobre fatos e conexões que não receberam a atenção devida. Esse é um blog que quer surpreender, escrito por alguém que gosta de ser surpreendido.